Parte III
ENSINAR NÃO É TRANSFERIR CONHECIMENTO
Saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.
Quando entro em uma sala de aula devo estar sendo um ser aberto a
- indagações,
- à curiosidade,
- às perguntas dos alunos,
- a suas inibições,
- um ser crítico e inquiridor,
- inquieto em face da tarefa que tenho - a ele ensinar e não a de transferir conhecimento. (p. 53)
Saber necessário ao professor que ensinar não é transferir conhecimento precisa ser constantemente testemunhado, vivido.
Curso de formação (p. 54):
- Ao falar da construção do conhecimento, criticando a sua extensão, já devo estar envolvido nela, e nela, a construção, estar envolvendo os alunos;
- estimular o clima democrático na escola por meios e caminhos autoritários;
- sem 'implicar' um juízo falso, ideológico;
Pensar certo - e saber que ensinar não é transferir conhecimento é fundamentalmente pensar certo - é uma postura exigente, difícil, às vezes penosa, que temos de assumir diante dos outros e com os outros, em face do mundo e dos fatos, ante nós mesmos. (p. 54-55)
O clima do pensar certo não tem nada que ver com o das formulas preestabelecidas, mas seria a negação do pensar certo se pretendêssemos forja-lo na atmosfera da licenciosidade ou do espontaneísmo. Sem rigorosidade metódica não há pensar certo. (p. 55)
1. Ensinar exige consciência do inacabamento
Como professor crítico, sou um "aventureiro" responsável, predisposto à mudança, à aceitação diferente. [...] Minha franquia ante os outros e o mundo mesmo é a maneira radical como me experimento enquanto ser cultural, histórico, inacabado e consciente do inacabamento.
"[...] Na verdade, o inacabamento do ser ou sua inconclusão é próprio da experiência vital. Onde há vida, há inacabamento. Mas só entre mulheres e homens o inacabamento se tornou consciente" (p. 56)
[...] O do inacabamento de ser humano. Na verdade, o inacabamento do ser ou sua inconclusão é próprio da experiência vital. Onde há vida, há inacabamento. Mas só entre mulheres e homens o inacabamento se tornou consciente. [...] (p. 56)
"Só os seres que se tornam éticos podem romper com a ética." (p. 56)
Gosto de ser homem, de ser gente, porque não está dado como certo, inequívoco, irrevogável que sou ou serei decente, que testemunharei sempre gestos puros, que sou e que serei justo, que respeitarei os outros, que não mentirei escondendo o seu valor porque a inveja de sua presença no mundo me incomoda e me enraivece. Gosto de ser homem, de ser gente, porque sei que minha passagem pelo mundo não é predeterminada, preestabelecida. Que meu "destino" não é um dado mas algo que precisa ser feito e de cuja responsabilidade não posso me eximir. Gosto de ser gente porque a História em que me faço com os outros e de cuja feitura tomo parte é um tempo de possibilidades e não de determinismo. Daí que insista tanto na problematização do futuro e recuse sua inexorabilidade. (p. 58)
2 Ensinar exige o reconhecimento de ser condicionado
Gosto de ser gente porque, inacabado, sei que sou um ser condicionado mas, consciente do inacabamento, sei que posso ir mais além dele. Esta é a diferença profunda entre o ser condicionado e o ser determinado. A diferença entre o inacabado que não se sabe como tal e o inacabado que histórica e socialmente alcançou a possibilidade de saber-se inacabado. Gosto de ser gente porque, como tal, percebo afinal que a construção de minha presença no mundo, que não se faz no isolamento, isenta da influência das forças sociais, que não se compreende fora da tensão entre o que herdo geneticamente e o que herdo social, cultural e historicamente, tem muito a ver comigo mesmo. (p. 58-59)
CONSCIENTIZAÇÃO (p. 59-60):
- não como panacéia, mas como um esforço de conhecimento crítico dos obstáculos, vale dizer, de suas razões de ser;
- contra discursos fatalistas;
- é exigência humana, é um dos caminhos para a posta em prática da curiosidade epistemológica.
- Em lugar de estranha, a conscientização é natural ao ser que, inacabado,
"Continuemos a pensar um pouco sobre a inconclusão do ser que se sabe inconcluso, não a inconclusão pura, em si, do ser, no suporte, não se tornou capaz de reconhecer-se indeterminado. A consciência do mundo e a consciência de si inacabado necessariamente inscrevem o ser consciente de sua inconclusão num permanente movimento de busca. Na verdade, seria uma contradição se, inacabado e consciente do inacabamento, o ser humano não se inserisse em tal movimento. É neste sentido que, para mulheres e homens, estar no mundo necessariamente significa estar com o mundo e com os outros. Estar no mundo sem história, sem por ela ser feito, sem cultura, sem "tratar" sua própria presença no mundo, sem sonhar sem cantar, sem musicar, sem pintar, sem cuidar da terra, das águas, sem usar as mãos, sem esculpir, sem filosofar, sem pontos de vista sobre o mundo, sem fazer ciência, ou teologia, sem assombro em face do mistério, sem aprender, sem ensinar, sem idéias de formação, sem politizar não é possível." (p. 62)
"É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a educação como processo permanente. Mulheres e homens se tornam educáveis na medida em que se reconheceram inacabados. Não foi educação que fez mulheres e homens educáveis, mas a consciência de sua de sua inconclusão é que gerou sua educabilidade. [...]" (p. 63)
"Este é um saber fundante da nossa prática educativa, da formação docente, o da nossa inconclusão assumida. O ideal é que, na experiência educativa, educandos, educadores e educadoras, juntos, "convivam" de tal maneira com este como com outros saberes de que falarei que eles não virando sabedoria. Algo que não nos é estranho a educadores e educadoras." [...] (p. 63)
3 Ensinar exige respeito à autonomia do ser do educado
Outro saber necessário à prática educativa, e que se funde na mesma raiz que acabo de discutir - a da inconclusão do ser que se sabe inconcluso -, é o que fala do respeito decido à autonomia do ser educando. Do educando criança, jovem ou adulto.
Como educador, devo estar constantemente advertido com relação a este respeito que implica igualmente o que devo ter por mim mesmo.
[...] O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético, a sua inquietude, a sua linguagem, mais precisamente, a sua sintaxe e a sua prosódia; o professor que ironiza o aluno, que minimiza, que manda que "ele se ponha em seu lugar" ao mais tênue sinal de sua rebeldia legitima, tanto quanto o professor que se exige do cumprimento de seu dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à experiência formadora do educando, transgride os princípios fundamentalmente éticos de nossa existência. É neste sentido que o professor autoritário, que por isso mesmo afoga a liberdade do educando, amesquinhando o seu direito de estar sendo curioso e inquieto. Tanto quanto o professor licencioso rompe com a radicalidade do ser humano - a de sua inconclusão assumida em que se enraíza a eticidade. É neste sentido também que a dialogicidade verdadeira, em que os sujeitos dialógicos aprendem e crescem na diferença, sobretudo, no respeito a ela, é a forma de estar sendo coerentemente exigida por seres que, inacabados, assumindo-se como tais, se tornam radicalmente éticos. (p. 65)
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